Estes ignorados parágrafos, até a pouco tempo atrás,
tinham sido escritos e lidos apenas por mim, talvez pelo receio ou mesmo medo
de me expressar livremente em torno do labirinto da empregabilidade em
Moçambique e ser confundido como um elemento político em objecção ao sistema
vigente.
Todos dias nas televisões vemos pessoas discutirem o
problema da empregabilidade em nosso país. Todos dias essas pessoas apontam
para a crise económica como a principal causa do desemprego. Todos dias esquecem
a antiguidade da falta de oportunidades de emprego em Moçambique.
Quando em mil novecentos e setenta e cinco nos tornamos
independentes da colónia fascista portuguesa, herdamos uma economia atrasada,
deformada e dependente. Dentre várias causas, estava o facto do abandono em
massa dos portugueses do país, toda a força do trabalho com formação, este
facto viria a ter grande influência na continuação do desenvolvimento do país.
Passados trinta e oito anos, continuamos a ignorar este problema
na qual ainda ressentimos e porque temos alguns milhares de técnicos médios e superiores
formados, maltratamos as novas e futuras gerações dando-lhes uma educação sem
qualidade, uma educação sem formação. Pensamos que o país está abastecido de
quadros e que já não há mais emprego. Afirmamos que para estes a leitura e a
escrita é o mais essencial e enterramos sonhos. Só porque atingimos uma fase
onde para um professor formado ter uma vaga tem que esperar que um colega morra
para poder o substituir. Vivemos na sombra do capitalismo, inalamos um discurso
político em torno do empreendedorismo enquanto erguemos o socialismo sonegado.
Hoje, vós filhos da Pátria Amada e não só, netos de uma
África condenada pelo ocidente com ajuda dos seus próprios líderes, encontram-se
no desespero por falta de emprego. Tantas foram as tentativas de concorrer para
uma vaga já ocupada, agora presos na angústia da mais
ampla expressão acham estreiteza, negra ideia do abismo assombra a vossa mente.
Eu também sinto isso, sinto a vossa alma querer lutar com vosso tormento.
Contenda inútil! Vejo-vos procurar forças para enfrentar a injustiça da
selecção dos candidatos nos concursos; vejo-vos procurar canal seguro para denunciar
o nepotismo e a corrupção na atribuição das vagas e vejo-vos atrás de forças
para ultrapassar a sensação de impotentes.
Não nos embrenhemos no vale do desalento. Digo-lhes hoje,
meus amigos, que apesar das dificuldades e frustrações do momento, eu ainda tenho um sonho.
Um sonho difícil, mas possível.
Eu tenho
um sonho que um dia a justiça social será reposta e as
oportunidades de emprego serão iguais para todos moçambicanos, seja do Norte ou
do Sul, seja do campo ou da cidade. Eu tenho um sonho que amanhã mesmo
aquele cidadão pacato que vive no bairro de lata em Muaivire ou Santagua, vai
ter oportunidades de se formar e andar de gravata como aqueles jovens da
cidade.
Eu tenho
um sonho que um dia cada cidadão
terá apenas um emprego, o que permitirá o incremento da auto-estima do
trabalhador, fortalecerá o conhecimento, competências e habilidades para dar
mais contributo na economia do país.
Eu tenho
um sonho que amanhã vocês não
permitirão essa penúria que vivemos hoje. Um dia deixaremos de pagar dinheiro para
comprar uma vaga, seja na função pública ou no sector privado, porque teremos
um gabinete de combate a corrupção mais vigilante e funcional.
Eu tenho
um sonho que um dia vocês acabarão com a edificação de genealogia
nas instituições do estado favorecidas pelo nepotismo. Eu tenho um sonho que amanhã mesmo aquele cidadão pertencente a uma
agremiação política dominante no momento terá que passar por um concurso
público para conseguir o emprego.
Meus amigos! Eu
tenho um sonho muito difícil, mas não impossível.
Eu
tenho um sonho que um dia vocês
formados em História, Literatura, Línguas Bantu, Filosofia, entre outras
ciências sociais se orgulharão das vossas áreas de formação e não sofrerão mais
as humilhações de vozes ignorantes e agressivas de que o vosso ramo não é
relevante para o momento que o país se encontra (improdutivos). Um sonho
moçambicano onde todas profissões desfrutarão do mesmo valor e respeito, onde
não existirão profissões “condenadas do sistema”.
Com a concretização do meu sonho alcançaremos a concórdia,
a paz e o desenvolvimento. Erguer-se-á o verdadeiro contrato social do Estado
com seu povo. Os jovens do Pântano Quelimanensse até Matola, da Beira a Baia de
Pemba poderão desfrutar os mesmos horizontes do sol que brilha em suas mentes, “renascerá
o sonho ondulado na Bandeira e lavrarão na certeza do amanhã”.
Nós vivemos hoje as imposições do capitalismo o “open-market”,
contudo a nossa educação, o nosso ensino continua longe de responder as nossas
perspectivas, ela não é objectiva, não é praticável, pois continuamos a falar
de empreendedorismo enquanto mal formamos pessoas para o mercado de emprego.
Essas políticas devem extravasar a retórica, porque senão nunca seremos iguais
ao nosso sonho.
Este é o meu sonho e gostaria que fosse vosso também,
para amanhã todos dizermos “sim, nós podemos”, temos que ter fé nele, para
amanhã não nos tornarmos órfãos das nossas próprias utopias.
Nordito Hilário
Pente